quarta-feira, 23 de julho de 2008

O HUMOR E A POESIA

ALTEREGO: Você já foi muitas coisas na vida e hoje você se diz humorista. O humor é a síntese da sua missão, da sua arte?
REIFF: Que pergunta! Hoje eu digo que sou humorista porque a sociedade precisa de rótulos. E porque não quero mais que as pessoas me pensem como publicitário, se é que elas me pensam. Também me agrada dizer que sou músico, mímico, cartunista, embora nunca tenha assumido nada disso profissionalmente. Digo que sou humorista porque preciso dar um pouco de foco às minhas atividades, e o humor tem permeado muito do que eu quero dizer hoje. Mas eu acho que gostaria mesmo é de poder dizer que sou poeta. Sou amigo de grandes poetas desde pequeno, embora eles nunca tenham sabido disso.

ALTEREGO: Quem, por exemplo?
REIFF: Em minha adolescência, Vinícius frequentava minha casa e as dos meus amigos, em Bebedouro, minha terra natal. Entrava pelas páginas de seus livros. Convivíamos com ele. Com o Chico Buarque, de quem comprávamos todos os discos. O Drummond e o Neruda também participavam de nossos encontros. E tínhamos um poeta praticante entre nós, o Rodolfo Moreira Castro. Eu era fã do Rodolfo tanto quanto era do Drummond. Com a diferença que com o Rodolfo dava pra catar os cacos de poesia que ele ia deixando pelo dia-a-dia.
Existiam uns facículos de literatura comentada que eram esperados ansiosamente por mim toda semana. Conheci Ferreira Gullar, Mário Quintana, Manoel de Barros, Fernando Pessoa. Sempre gostei muito da prosa poética. Mais solta, mais coloquial, flúida, contemporânea. A forma é maravilhosa quando bem usada. Mas o olhar poético é insubstituível.

ALTEREGO: E qual a correlação que você vê entre o humor e a poesia?
REIFF: O humor e a poesia têm limites muito tênues entre si. A origem da palavra humor está relacionada com os influxos emocionais da alma humana. O humor subverte, transcende. Ele é capaz de driblar a mesmice, a miopia e a mecanicidade da condição humana. Através do humor e da poesia o homem se universaliza, se espiritualiza, ganha sabedoria. Eu gosto muito do humor fino, do humor inteligente, que dorme na mesma cama com a poesia.

terça-feira, 22 de julho de 2008

T O Q D Z

ALTEREGO: Criar não é fácil. Como é que o artista pode se adubar pra essa necessidade?
REIFF: Tomando gosto pela vida. A arte dos outros nos ajuda a olhar pra vida de uma forma mais nutritiva. A gente se sensibiliza, vê as coisas através de novos pontos de vista, e vai tendo algo a dizer, a partir do que se sente. Aí a gente transborda em arte. Que ajuda os outros a olhar pra vida de uma forma mais nutritiva e assim por diante. Mas a grande parada é tomar gosto pela vida. É degustar as sensações, quaisquer que sejam elas. Assim a gente pode falar algo real e pulsante na nossa arte.

ALTEREGO: Você acha que a internet banalizou o fazer artístico?
REIFF: Não. Muito pelo contrário. Criou espaço para que as pessoas buscassem se descobrir fazendo arte. Os críticos dizem que a enxurrada de coisas ruins acaba escondendo as coisas que realmente são boas. Mas eu não concordo. Porque as coisas que realmente são boas, que têm consistência, acabam conquistando seu merecido espaço. Mas tudo que foi feito de ruim certamente teve a importante função de despertar cada autor para um tipo de fazer artístico. O espaço dado fez com que as pessoas deixassem de falar, pra começar a fazer. A própria diversidade nos proporciona uma visão crítica muito mais sofisticada sobre aquilo que entendemos por arte.

ALTEREGO: Mas você não acha que a cultura de massa, por ter apelo comercial, rouba um importante espaço que seria dado a coisas mais elaboradas?
REIFF: Sim e não. Acho esse tipo de resposta perfeito. Porque pra tudo existe um sim como existe um não. Se por um lado alguns investidores pretendem ter números de audiência, outros preferem ter qualidade de audiência. Assim, o espaço virtual abre campo para os mais diversos interesses sejam atendidos. Pequenos grupos podem estar dispostos a pagar bem por artigos que antes não encontravam, porque o mercado não tinha espaço para produtos pouco comerciais.

ALTEREGO: Tem se observado que, de forma geral, o artista criativo não tem controle sobre a sua obra, nem recebe dividendos do seu sucesso da sua obra na net. Como você vê a questão da remuneração do artista nesse novo ambiente?
REIFF: Essa é uma questão profundamente interessante. Especialmente porque subverte ordens e valores pré-estabelecidos. De onde as pessoas esperam, o dinheiro não virá mais. Entretanto, virá de muitos outros lugares. Quando alguém tem o que dizer, infinitas possibilidades se abrem. Porque em qualquer espaço é útil se ter pessoas que agreguem, que inspirem, que transformem. As atividades produtivas todas estão passando por transformações profundas. Quem tem o que dizer vai acabar virando referência nesses novos tempos.

domingo, 20 de julho de 2008

PRÓS E CONTRAS

ALTEREGO: Quais os prós e os contras que você vê na sua arte?
REIFF: Na minha arte, eu não sei. Em mim, eu sei um pouco. O falta e o excesso de humildade. A verdadeira arte flui entre os gravetos do nosso ego. O ego é uma merda. Mas é da merda que nós rimos. A idiotice humana é o suprassumo do humor, a quintessência. Quando nos damos conta dessa ilusão toda na qual vivemos, temos um lampejo de iluminação. Por isso que o humor é algo divino.

ALTEREGO: Não mude de assunto. Quais são os defeitos que você vê em si mesmo?
REIFF: Essa coisa de perder o foco, de pensar a vida em hiperlinks, desde pequeno. Viajar demais é o meu pior lado. Mas também é o melhor.

ALTEREGO: Por quê?
REIFF: Porque a vida pode ser mais imaginativa, mais criativa, mais espirituosa. E nisso eu posso contribuir. Por outro lado, quem vive num planeta onde se paga contas tem que realizar. E pra isso é preciso ter foco, concentração, planejamento. Eu sou DDA. Tenho o tal Distúrbio do Déficit de Atenção. A minha mente salta de galho em galho que nem macaco. Pode ter dado a volta ao mundo, mas não chegou em lugar algum.
Estou escrevendo, resolvo pegar o sax e tocar uma música, aí me dá vontade de ligar pra alguém, mas eu me lembro que preciso tirar a roupa do varal, no caminho resolvo fazer um pão de queijo, mas me lembro que as compras ficaram no carro, aí me lembro que o carro ficou no supermercado...

ALTEREGO: Não deve ser fácil conviver com alguém assim.
REIFF: Em muitos momentos eu não me aguento. Se eu consigo rir de mim, é um alento.
O ungüento. Hoje eu rio. Amanhã eu oceano.

sábado, 19 de julho de 2008

TEATRO

ALTEREGO: Você é formado em Direito, estudou na USP, fez especialização e abandonou tudo pra trabalhar com Propaganda. Qual a explicação?
REIFF: Não tem explicação. Trabalhei quase 20 anos com Propaganda e voltei a largar tudo pra viver de teatro. Tem um livro sobre a vida do Flávio Rangel que tem esse nome "Viver de Teatro". Acho que deve ser o máximo poder viver de teatro.

ALTERGO: Você não fez nenhum curso profissionalizante de teatro, como você se vê como ator.
REIFF: Péssimo. Eu não sou ator. Sou um performático, que executa a que cria. Assim é mais fácil. O ator requer um grau de disponibilidade que eu ainda não cheguei a ter. Acho que ainda tenho muito ego no meio do caminho. Sou meio durão. Fiz muitos cursos livres de teatro, mas foi só pra respirar teatro mais de perto.

ALTEREGO: E o que é o teatro pra você?
REIFF: Não sei. Ápenas sinto. Eu assistia a todas as peças disponíveis na Campanha da Kombi. Fazia todos os cursos livres. Participava de todos os seminários para a discussão do teatro: TAPA, AGORA, CPT...Acho que o teatro era um universo mágico, um exercício de criar vida. Até hoje não sei o que é o teatro. Assim como não sei o que é Deus. Apenas sinto.

quinta-feira, 10 de julho de 2008

ALTEREGO: Você mexe nas coisas que faz?
REIFF: Durante muito tempo eu não mexi. Achava que a peça tinha o frescor daquele exato momento, que deveria ser cristalizado pela arte. Mas depois, com as facilidades do computador, comecei a trair meus ideais. Eu acreditava que a minha vida seria estudada e que seria mais fácil para o meu biógrafo encontrar coerência se a coisa fosse analisada à luz daquele contexto. Hoje eu não tenho essas pretenções. Tem coisas que eu lapido mesmo, porque acho que têm potencial pra melhorar.

ALTEREGO: Por que você achava que teria um biógrafo?
REIFF: Não sei. Guardava cadernos do primário. Um dia joguei tudo fora. O mais importante pra mim não é mais ser reconhecido como um talento precoce. Mas é deixar disponibilizar alguma coisa que seja boa. Cada vez mais eu me vejo como um canal. Já sou suficientemente grato, feliz e satisfeito por experimentar esse olhar poético sobre a vida. Nenhum reconhecimento vai me dar mais prazer do que o próprio prazer de ver a vida de forma holográfica, como eu acho que vejo.