domingo, 30 de março de 2014

ENTRE VISTAS

A tarde está fresca. Uma brisa suave ondula os cabelos.  Morfino e Márcio Reiff estão sentados numa mesa de boteco. O garçom é amigo dos dois. Sem contar pra ninguém, passou a mesa na frente. Amigos amigos, negócios à parte. 

MORFINO: Vou deixar o gravador ligado, porque quero aproveitar esse encontro pra te entrevistar.
REIFF: Eu tenho um certo medo das suas entrevistas. 
MORFINO: Dizem que amigo bom é o que te bota na parede. 
REIFF: É por isso que somos amigos. (risos)
MORFINO: Tem muita coisa sua que eu acho que você deveria estar sob efeito de psicotrópicos. É assim que você produz?
REIFF: O que eu produzo sob efeito de psicotrópicos eu mandarei diretamente pro Instituto Cannabis, no Canadá. E, oquei, às vezes eu publico, só pra saber se fico tão sem noção assim.
MORFINO: Dizem que você fica?
REIFF: Quem nunca comeu melado, quando come se lambuza. 
MORFINO: Falar com metáforas é coisa do Lula. 
REIFF: Nem me fale. Eu votei nele. Mas vamos falar de coisas boas.
MORFINO: Você tem um filho adolescente, não é?
REIFF: Tem dias que ele está mais adolescente. Mas tem 8.
MORFINO: O que ele acha de ter um pai assim, tão fora da caixinha?
REIFF: Faça uma entrevista com ele. (risos)
MORFINO: Você criou o Projeto Nossa História a Gente Inventa, para crianças, faz ilustrações ingênuas, infantis, você gostaria de trabalhar só com crianças? E mais: você é a reencarnação do Peter Pan?
REIFF: (risos) Acho que sim. Estou ficando cada dia mais moleque com cara de tiozinho. Eu adoro inventar histórias com crianças, porque elas viajam mais facilmente. Mas levar esse espírito infantil pro mundo adulto é um desafio que me inspira...
MORFINO: E você faz o que com isso?
REIFF: Hoje eu me realizo muito com a banda OIO, que é uma banda aberta, não tem titulares fixos. São amigos que se encontram pra  falar sobre qualquer coisa, tendo a música como pano de fundo. 
MORFINO: É tudo uma improvisação?
REIFF: Sim. O que se requer é o exercício de somar olhares sobre qualquer coisa. Conhecendo outros olhares, a gente pode escolher. 

Começa a cair uma chuva de outono. O gravador é desligado.

quinta-feira, 20 de março de 2014

MORFINO: Um dia desses você disse numa entrevista para a Folha de São Paulo que o maior viciado é o olhar. É uma frase de efeito?

REIFF: Pode ser. Acho que o olhar viciado é o pai de todos os vícios. 

MORFINO: Você diria que as drogas em geral...

REIFF: São uma fuga pra o olhar viciado, que mata o ser humano de tédio. 

MORFINO: E tem salvação?

REIFF: Sacar mais os outros, porque a gente areja o olhar...eu diria...Observar detalhes das coisas, que vão além da observação automática.

MORFINO: E é fácil exercitar isso?

REIFF: É mais fácil quando a gente erra. Quando a gente se desvia sem querer de um caminho pretendido. Nessa hora a gente esbarra com algo novo. Em vez de lastimar o erro, a gente pode treinar o olhar pra valorizar essas novas percepções. 

MORFINO: Então você sugere que as pessoas errem de propósito?

REIFF: Numa percepção mais fina das coisas, todos nós erramos de propósito. Ainda o nosso olhar viciado não nos permita ver isso.
O humor ajuda muito.

MORFINO: Vamos falar sobre isso no programa FALANDO DE HUMOR?

REIFF: É um ótimo assunto! 




sábado, 8 de março de 2014

TALK SHOW COM PALHAÇO FILÓSOFO

Morfino é um palhaço metido a filósofo que entrevista seu criador, fazendo perguntas desconcertantes que só um palhaço é capaz de fazer.

MORFINO: Você diz que o humor está nos olhos, de quem faz ou de quem vê?
REIFF: De ambos. Quem faz humor propõe um novo ponto de vista, que só será visto por alguns. Eu diria que os seres humanos são tribos que se agrupam pelo olhar que tem das coisas.
MORFINO: O que enxerga o seu grupo?
REIFF:  Hoje todos nós temos facilidade de ter muitos grupos, porque a internet nos revela afinidades. É mais fácil a gente encontrar pessoas que se interessam pelas mesmas coisas, que compartilham os mesmos valores, enfim. Não tenho um grupo, mas vejo como denominador comum aos grupos que frequento a autenticidade. A inautenticidade está ficando careta.
MORFINO: Tem gente que te chama de “velho maconheiro”, qual é a sua autenticidade sobre esse assunto?
REIFF:  Se a pergunta é se eu fumo maconha a resposta é sim, e sempre que aparece numa roda de amigos. Não tenho comprado. Eu tenho uma tendência natural para viajar na maionese.  Fumado eu nunca consigo conter um turbilhão de ideias e acabo atropelando as pessoas. Mas é sacanagem me chamarem de velho, porque isso é foda. Um dia desses eu fui chamado pra fazer o teste de um comercial e a produtora me perguntou: “o senhor vai ser um dos velhinhos?”
MORFINO: (risos). Você fez 50 anos. Isso tá pegando?
REIFF: O que incomoda aos 50 é não estar pegando. (risos) Acho que a libido dá uma aquietada, a barriga teima em crescer, a gente tem muita paciência para algumas coisas e pouca para outras... Problemas de saúde começam a aparecer, como num carro velho. Eu estou um pouco inquieto sim. Parece que não vai mais dar tempo de eu fazer uma previdência privada.
MORFINO: Você tem medo de ir para o Recanto dos Artistas?
REIFF: Seria ótimo uma comunidade de artistas sem as frescuras do ego. Seria perfeito!

A entrevista só não continuou porque começou a chover e o palhaço Morfino derreteu.